quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Coincidências significativas

Conhecemo-nos por amor à Psicologia. Era um excelente homem e professor, daqueles que não usava máscaras nem subterfúgios que disfarçassem eventuais falhas académicas ou de carácter. A sua simplicidade, a forma apaixonada como contava as histórias da sua vasta prática clínica, a dádiva e vontade em querer partilhar as suas riquíssimas experiências de vida faziam dele um professor querido por todos.

Naquela tarde, estava inquieto e apreensivo. Viu-me ao fundo do corredor e chamou-me com a voz nitidamente consternada. Confidenciou-me que consultara um astrólogo que previra para breve a sua morte - "mais dois meses de vida, é o que terá"; disseram-lhe; assim, sem qualquer espécie de pudor. Não estranhei que comigo desabafasse, afinal, havia já algum tempo que lhe manifestara o meu profundo interesse pelos aspectos que relacionavam a linguagem astrológica e a psicológica, interesse que afinal ambos partilhávamos. Fiquei, isso sim preocupado, com o seu estado de pânico e pela falta de ética do presumível astrólogo. Tentei acalmá-lo dizendo-lhe que eventualmente poderia passar por uma situação de crise, mas que a morte, essa, era de difícil previsão, e que, nenhum astrólogo sério, com respeito pelo bem estar físico e psicológico de um cliente poderia cometer a imprudência de a comunicar; pedi-lhe inclusivamente os seus dados de nascimento para que eu pudesse perceber que aspectos astrológicos por trânsito e progressão estariam a evoluir nos céus. Acalmou-se o homem.

No dia seguinte, na posse dos seus dados de nascimento, verifiquei, que os aspectos astrais mais significativos recaiam sobretudo sobre questões relacionadas com a sua saúde, mais precisamente com eventuais problemas a nível respiratório.

Comuniquei-lhe o resultado da minha análise e disse-lhe que poderia passar por um período de alguma vulnerabilidade pulmonar mas que não correria qualquer perigo de vida; aconselheio-o no entanto a deixar de fumar. Os seus olhos brilharam e nem o meu aviso o demoveu dos seus hábitos tabágicos, já que acendeu ali mesmo um cigarro, que "saboreou" até ao fim. Estava deveras mais calmo e confiante.

O Outono aproximava-se. Necessitei fazer uma pequena intervenção cirúrgica num hospital de Lisboa. Despedia-me do enfermeiro quando passou por mim deitado numa maca o "meu" professor. Notei que se encontrava febril e frágil, mas ainda foi dizendo: - Afinal você tinha razão, senti-me mal esta manhã, com dificuldades respiratórias e alguma febre, mas percebi que não podia ir dar aulas, vou ficar cá uns dias, diagnosticaram-me uma bronco pneumonia.

Desejei-lhe as melhoras e fiquei a pensar no propósito deste invulgar encontro. Por mais que tentasse perceber os motivos desta “coincidência significativa” era claro que o esforço se revelava inútil. Afinal, desígnios há, que só a seu tempo nos são revelados, ou não.

Fernando Barnabé

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