Ela gostava de encontrar explicações para tudo; por isso a frase, "não há acasos" defini-a bem. O mais difícil, segundo ela, era conhecer-se, perceber o porquê daquela atração fatal pela descoberta dos mistérios da vida e da sua própria existência.
A vida era um martírio porque nela pensava obsessivamente. Escalpelizava ao pormenor as mais diversas e possíveis conexões entre situações já vividas e as que no presente experimentava, tentando encontrar padrões que a ajudassem a compreender a sua vida interior, mas, em vez de experimentar alívio, cada vez mais se adensavam as dúvidas e uma sensação de perda e inutilidade entristeciam-lhe os dias.
Bem lhe dizia o Ti Manel: - "Isso de pensar muito menina não a leva a lado nenhum, deixe que a vida aconteça”. De nada lhe valia o conselho, antes se eriçava no seu pedastal de universitária culta que há muito renegara o saber popular. - "O que sabe você da vida Ti Manel? As pessoas fizeram-se para pensar, porque isto de viver, não é só respirar, dar vazão aos instintos, comer e beber e repetir a dose todos os dias até ao último suspiro; assim a vida não tem graça Ti Manel. Olhe p`ra si, levanta-se de madrugada, faz o farnel, vai passear as ovelhas e ao fim do dia regressa a casa sem nada de novo para contar, a não ser que passou mais um dia e que a “Bonita” continua a ser a menina dos seus olhos. Diga-me lá Ti Manel, essa vida assim tão monótona, não o põe doente? Não gostaria de ir para a cidade, conhecer gente, quem sabe tentar outra profissão, você que tem tanto jeito para os trabalhos manuais? Você é feliz assim Ti Manel?
Ele olhou-a com ternura, a mesma que trazia nos olhos quando a sua “Bonita” paria e respondeu-lhe com a sabedoria da alma:
- A menina conhece um tal de Agostinho?
- Quem? O da mercearia, o filho da Ti Gertrudes?
- Não minha filha, aquele velhote de barba que aparecia na televisão, que era filósofo ou coisa parecida.
- Já sei Ti Manel, o Agostinho da Silva.
- Pois minha filha, esse senhor é que tinha razão e eu já há muito tempo que lhe conhecia a frase.
- Mas então que frase é essa? Conte-me lá...Não me diga que também deu em filósofo...
- Não sou filósofo coisa nenhuma menina, só sei é que não faço planos para a vida, porque desde sempre percebi que a vida já mos tem preparados. É com esta certeza que caminho todos os dias para o monte levando o meu farnel e as minhas “filhinhas”; não lhe chame aceitação ou tão pouco resignação... é que eu sou feliz, muito feliz assim menina!
Fernando Barnabé
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